Cronismo…você sabe o que é isto?

Não??? Então você não deve estar morando no Brasil. Ok, você mora, mas não sabe do que se trata. Um livro que divulgou este conceito no Brasil é o do Lazzarini. Mas você pode aprender também sobre isto neste video. Este blogueiro (junto com o Leo Monasterio) já falava de rent-seeking no Brasil desde o final do século passado. A galera, contudo, custou a nos acompanhar na literatura. Ao longo destes primeiros 13 anos do século, vimos vários autores e artigos sobre o tema. Claro, tudo começou com o Jorge Vianna Monteiro (embora muita gente não pareça saber fazer pesquisa científica direito e, portanto, não faça a revisão da literatura corretamente).

O termo rent-seeking nunca saiu muito das conversas de economistas e alguns poucos cientistas políticos esclarecidos. Claro, havia também a competição dos marxistas, sempre receosos de perderem sua platéia para teorias concorrentes. Mas, aos poucos, as coisas mudaram. Aí alguém, acho que foi o Gary Becker, popularizou o termo capitalismo de compadres (ou de compadrio). Paralelamente, a mudança de gerações nas redações de jornais e a tecnologia ajudaram a popularizar as idéias de Tullock, Olson, Buchanan e outros. Mesmo assim, convenhamos, “capitalismo de compadres” não é um termo muito retórico, no sentido da McCloskey.

Aí, agora, veio este novo termo, o tal “cronismo”. No fundo, no fundo, fala-se do mesmo fenômeno. Mas parece que este termo está se popularizando com certa facilidade. Ajuda, claro, a corrupção desenfreada que assistimos no Brasil desde a primeira administração da Silva (agora também conhecido como “Lula”, “Lula da Rose”, “o Barba”, dentre outros divertidos apelidos). O desencanto dos eleitores não deixa de ter um impacto positivo: o aumento do ceticismo e do grau de exigência quanto às suas demandas políticas. Claro que isto não necessariamente melhora a qualidade do setor público ou diminui a corrupção, mas o realismo trazido pelo ceticismo é sempre saudável.

Amo muito o bem público produzido pelo setor privado

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Pois é, leitor. Sempre que alguém vem a BH eu fico sem saber o que dizer. Aqui, convenhamos, não tem nada. Nada mesmo. Mas aí o setor privado, muito mais do que esta prefeitura ineficiente (vem assim desde a época do Célio de Castro e seus sucessores, mas não era muito melhor antes…enfim…), consegue me salvar.

Bem público produzido pelo setor privado com motivos “egoístas” (se ganhar dinheiro para pagar as contas é egoísmo, então Luis F. Verissimo e eu somos os mais egoístas do mundo…junto com você, leitor). Exemplo que poderia estar em qualquer livro-texto de Economia. Gostei tanto que fiz todo um malabarismo para comer na bandeja sem sujar o sanduíche e as fritas (e, sim, eu consegui fazer isto!) para guardar esta excelente peça de propaganda.

Aliás, gostei tanto que a empresa ganhou o direito a uma propaganda gratuita aqui.

E agora, para algo mais técnico…

O que é um bem público? Antes que você pense no senso comum, esta é uma definição técnica, um conceito teórico. Um bem público é um bem não-excludente e não-rival. O melhor exemplo disto está no livro-texto do Mankiw. Uma estrada com pedágio é excludente (sem pedágio, portanto, não-excludente). Uma estrada congestionada é rival (porque o espaço entre carros diminui. O consumo do mesmo pedaço de chão é rivalizado com outro motorista e seu pequeno SUV…). Sacou?

Bom, então fica meio óbvio – ou então você dá uma pesquisada na internet, ok? – que alguém que busque lucrar não tem muito motivo para produzir um bem público…em princípio. Por que? Porque não dá para lucrar tanto quanto se você produz um bem privado (rival e excludente). Claro que esta classificação do bem ou serviço em “privado” e “público” é uma questão de grau (além do fato de existirem bens rivais, não-excludentes e não-rivais, excludentes). Mais ainda, o grau pode ser alterado conforme a tecnologia mude. Pense no caso da TV. Há algumas décadas, era impossível vender um pacote de canais como um bem privado (o que se fazia era vender um bem público (o pacote de canais) com um financiamento via propaganda).

O que isto tudo tem a ver com o McDonald’s? Simples. A informação turística é um bem público. Supostamente, o governo poderia criar uma secretaria de turismo (esqueçam a ironia da coisa…ou melhor, dêem uma boa risada e prossigam) para prover os turistas de informações como esta. Bem, a coisa mais difícil do mundo é achar um guia turístico desta cidade de fácil acesso e na hora que você precisa. Aí entra a campanha da cadeia de fast-food, em busca de lucros com a praça específica de Belo Horizonte. De forma inteligente, percebe-se que homenagear a cidade torna o consumo do sanduíche mais agradável. A experiência de se comer dois pães e carne não se distingue, em princípio, por conta do lugar onde você o compra. Contudo, diferenciar o produto é uma prática mais antiga do que a prostituição (se é que não nasceu com a mesma…).

Portanto, ao vender um sanduíche (bem privado) com uma folha de papel destas, com uma propaganda da cidade, agrega-se à experiência de consumo um certo valor que, imaginam os donos do boteco, aumentará suas vendas. Bem, não estou eu aqui falando bem da propaganda?

Voltando ao hambúrguer…

Pois é. Eu pensei até em voltar hoje para comer um outro hambúrguer deles, mas não sou tão fã assim do consumo diário de McDonald’s. Mas fica aqui o exemplo, a evidência (talvez a milésima, neste blog) de que bens públicos podem ser produzidos de forma eficiente pelo setor privado. Eu diria, neste caso, até mais eficientemente do que o setor público municipal sequer poderiaimaginar alcançar um dia.

Antes de me despedir, eu me pergunto: burocratas, sempre tão invejosos dos sucesso alheio (dentro ou fora de seu mundinho, a repartição), adoram sabotar a concorrência com um papo furado muito bonito de “proteção às crianças, índios, animais domésticos, mulheres, etc”. Papinho bem ruim mesmo. Mas, às vezes, há até uma boa justificativa para tal, embora raramente me pareça ser a regra seguida por eles. Eu me pergunto quando vão proibir a cadeia de fast-food de produzir informações turísticas porque “apenas o fazem pelo lucro”.Como se os burocratas não maximizassem nem mesmo seu orçamento…

Vovô não quer BigMac. E agora, Ricardo?

Eis aí algo que é verdade aqui ou no Japão. O texto do casal de blogueiros é recheado de elementos que você pode usar para discutir com seus amigos, professores ou, claro, com seu avô. Eu ainda destacaria um ponto específico, além do demográfico: a questão ricardiana. Cito com negrito por minha conta:

If the central point of Abenomics is to boost prices and thus wages and consumption — the old “raise all boats” metaphor — then to a certain extent the plan has succeeded over the last year. Consumers don’t seem to be fixated on cheap goods and services any more, though, to be honest, it’s difficult to tell if this willingness to spend more is a function of anticipation for April’s consumption tax hike.

Pois é. A administração do Primeiro-Ministro Abe sabe que a política fiscal não é um saco sem fundo (até o do Papai Noel não tem buracos, vale lembrar…). Portanto, mesmo com o estímulo fiscal, a antiga promessa de aumentar o imposto sobre o consumo foi aprovada pelo parlamento.

E agora, para algo completamente diferente…ou pelo menos mais técnico.

A aprovação legal nos traz uma redução na incerteza jurídica, já que todos sabem que a lei, em um país desenvolvido (= civilizado) será cumprida sem maiores problemas. Mais ainda, o aumento tem data e foi anunciado. Então estamos diante de um clássico problema de Macroeconomia de se saber qual é o impacto de uma política anunciada em um mundo em que as expectativas racionais opera.

A proposição Barro-Ricardiana de livro-texto nos diz algo bem simples: se eu sei que vou ter que pagar impostos amanhã, eu poupo hoje. Já num mundo não-Ricardiano (ou não-Barro-Ricardiano), o reduzido imposto de hoje, sob a expectativa de aumento do mesmo amanhã, provavelmente me induzirá a consumir mais. Tudo isto, claro, ceteris paribus.

Mas quando se fala do Japão, é bom ter em mente um ponto muito importante que não tem nada a ver com aquela lenda de “cultura oriental”, mas sim com a demografia (o tal bônus demográfico que meus amigos Salvato, Ari e Bernardo explicam aqui, para o caso brasileiro). Os autores do post falam do desejo dos mais velhos em consumir produtos de qualidade maior (embora exagerem na ênfase). Não apenas isto, mas “mais velhos” no Japão significa que estamos falando de pessoas cujo padrão de consumo alimentar é bem distinto do moderno fast-food norte-americano que os jovens tanto parecem gostar.

Barro, na própria discussão de sua proposição, já havia discutido a questão demográfica ao falar do argumento do altruísmo (herança) que justificaria o efeito da equivalência no, digamos, longo prazo. No caso do post dos autores, a demografia não está tanto no longo prazo, mas no curto prazo (acho que se fala “coorte” lá em demografia). Estamos falando de um modelo de overlapping generations destes simples. Ou seja, no mesmo período de tempo convivem duas gerações distintas: a mais velha e a mais nova (estou supondo, por simplicidade, apenas duas gerações). Só que, ao contrário do modelo de livro-texto, estamos dizendo que o padrão de consumo das gerações é distinto: uma prefere consumir mais fast-food e outra prefere alimentos de maior tempo adicionado (é, eu pensei em algo comohousehold production models que o Tyler Cowen, implicitamente, usa aqui).

A pergunta, portanto, neste caso, é a seguinte: em um modelo simples, com dois períodos, o que acontece quando tornamos o bem “consumo” (que é, lembre-se, estudante de graduação, sempre sinônimo de consumo de bens não-duráveis) heterogêneo? Primeiro, à la ciclos reais, temos duas gerações e, adicionalmente, agora, colocamos a heterogeneidade do consumo. Suponha que o restante do modelo funciona tal como antes. Ah sim, é importante fazer o destaque didático-científico: mantenha as expectativas racionais. Afinal, pode ser que algo mude (ou não) no modelo, mesmo que não haja nenhuma mudança no tipo de racionalidade dos agentes (esta é uma observação para os eternos apressados que desejam, loucamente, jogar fora a racionalidade sem antes relaxar outras hipóteses do modelo. Interessados vejamisto).

Será que a equivalência barro-ricardiana se mantém? Poderia ser uma questão de prova, mas fica para o espaço de comentários. Preferencialmente, gostaria de ver citações de papers que trataram do assunto com hipóteses semelhantes.

Pesos, medidas e as instituições

Douglas Allen, em seu ótimo, The Institutional Revolution, defende a tese de que uma revolução institucional teria precedido a famosa revolução industrial. Texto importante, é que, para mim, já é candidato a livro-texto básico de qualquer bom curso de História Econômica.

Como sempre, senti falta de alguma coisa mais, digamos, tropical, no livro. Bom, mas como é que vou cobrar isto de um livro que não se propõe a contar a história das instituições em Portugal? Não posso. Isto é mais uma deixa para os pesquisadores brasileiros. Dica de amigo, quem sabe, para alguém que deseje fazer uma dissertação de mestrado sobre o tema.

Mas eu sou uma pessoa perigosamente curiosa. Fiquei intrigado com a questão dos pesos e medidas. No argumento do autor, a questão dos pesos e medidas, ou melhor, a questão da padronização de pesos e medidas, está diretamente relacionada com a mensuração de produtos, o que gera uma importante alteração nos custos de se trocar mercadorias (ou seja, nos custos de transação). Afinal, nada mais óbvio do que achar mais interessante comprar um quilo de abacate sem levar para casa meio quilo do mesmo.

No caso do Brasil colonial, então, pensei, deveria ser como em Portugal. Para checar isto, consultei este documento. Vejamos alguns trechos:

No que se refere às unidades de medidas adotadas ao longo do período colonial, o quadro não difere, como é natural, daquele oferecido por Portugal. A vara, a canada e o almude constituíam as medidas de uso mais comum, ainda que seu valor pudesse variar de região para região. Os produtos importados traziam consigo suas próprias medidas e, quanto mais geograficamente restrita uma atividade econômica, mais específico era o sistema de medidas utilizado. (…)

Vale dizer: nada muito diferente do restante da Europa.

Assim, a primeira menção expressa à atividade metrológica, em documentos coloniais, refere-se precisamente à fiscalização do funcionamento de mercados locais. Como em Portugal, o funcionário colonial mais diretamente envolvido com a fiscalização de pesos e medidas era o almotacé, mencionado pelas Ordenações Manuelinas e Filipinas e previsto pela organização do município de São Vicente, em 1532. Em número de dois, eleitos mensalmente pela Câmara Municipal, os almotacés tinham como atribuição básica manter o bom funcionamento dos mercados e do abastecimento de gêneros, além de fiscalizar obras e manter a limpeza da cidade. Como parte de suas responsabilidades, deveriam verificar mensalmente, com o escrivão da almotaçaria, os pesos e as medidas. Tal disposição estimulava, dada a dispersão e a diversidade dos municípios, a multiplicação dos padrões de medidas.

Veja só a importância do ofício. Alguém imaginaria que carregar uma régua ou uma fita métrica, hoje em dia, seria uma profissão digna de tanta importância? Bem, numa época em que o governo descobre que medir ajuda a maximizar sua receita, nada mais natural, não? Até eleição para o cargo havia.

No caso dos gêneros estancados ou submetidos a controles mais rígidos, a Coroa cuidava da melhor organização das atividades metrológicas. O estabelecimento do monopólio do tabaco, por exemplo, levou à criação, em 1702, do Juiz da Balança do Tabaco, nas alfândegas de Salvador e Recife. No caso das minas, o regimento do Intendente do Ouro, de 26 de setembro de 1735, mencionava expressamente sua obrigação de manter as balanças e marcos da Intendência aferidos, pesando o ouro corretamente, sem prejuízo das partes nem da Fazenda Real, atribuição expressamente mantida no regimento de 1751.

Como se percebe, a questão institucional é indissociável da questão econômica. Veja aí o depoimento do próprio autor: tem monopólio? Quem é o “dono” do monopólio? A Coroa. Reza o dito popular – e a teoria econômica – que “o olho do dono engorda o cavalo” – e não é diferente neste caso.

Pois bem, falta-nos – alô, colegas de História Econômica! – um estudo mais detalhado do papel dos almotacés (ou me falta mais pesquisa e leitura, vai saber…), não falta? Vou procurar meu exemplar de Fiscais e Meirinhos para rejuvenescer, digamos assim, meu interesse pelo tema.

Novamente, percebemos que a História Econômica não precisa nos dar sono.

Antes do feminismo existe o indivíduo. E o que ele pensa?

Outro trecho do ótimo Rational Optimist, do Matt Ridley:

When shown a photograph of an attractive man and asked to write a story about an ideal date with him, a woman will say she is prepared to spend time on conspicuous pro-social volunteering. By contrast, a woman shown a photograph of a street scene and asked to write about ideal weather for being there, shows no such sudden urge to philanthropy. (A man in the same ‘mating-primed’ condition will want to spend more on conspicuous luxuries, or on heroic acts.)

Ou seja, a psicologia evolucionária nos mostra que homens ou mulheres (ou qualquer outra coisa no meio destes dois aí) que pense, não o faz conforme a doce visão romântica e engraçada das crônicas publicadas no jornal de domingo. Não, antes disso, existe um belo de um auto-interesse.

Por exemplo, isso significa que aquela mulherada toda na passeata não pensa apenas em termos benevolentes, sob um suposto “altruísmo” (cuja discussão nos mostra ser um conceito para lá de falho e enganoso…).

Claro, continuo recomendando o livro.

Ah, se tivessem dado ouvidos às evidências científicas…

Lembra de todo “auê” em torno do Fome Zero? Aquele slogan bem breguinha de que quem tem fome quer furar fila, e tal? Pois é. Aí veio a POF de 2003 e descobriu-se que não havia tanto motivo para a choradeira. Muita gente calou a boca e saiu com o rabo entre as pernas, outras apelaram, etc.

Aí você pega um bom livro para ler, como o Heavy!  (HEAVY!: The Surprising Reasons America Is the Land of the Free-And the Home of the Fat, Springer Verlag) do Richard McKenzie, e encontra:

Today, the distribution of the country’s weight problems across income classes has reversed, as excess weight problems are disproportionately concentrated among the poor.

Como está no kindle, não tenho a página. Mas digo uma coisa: as evidências empíricas não são novas. O motivo de não se dar ouvidos às evidências é uma mistura de ignorância intencional (grupos de interesse) e não-intencional. Como sempre, a gente se lembra de como as más idéias também movimentam o mundo.

Evidentemente, não há nada de indigno ou de errado em faturar um hambúrguer de vez em quando. Como nos lembra Matt Ridley, em The Rational Optimist (P.S.):

Fire and cooking in turn then released the brain to grow bigger still by making food more digestible with an even smaller gut – once cooked, starch gelatinises and protein denatures, releasing far more calories for less input of energy. As a result, whereas other primates have guts weighing four times their brains, the human brain weighs more than the human intestine. Cooking enabled hominids to trade gut size for brain size.

Sim, também no Kindle. Bom, Matt Ridley está nos dando uma interessantíssima evidência de que o processo digestivo, hoje glamourizado pela comida barata (obrigado, produtividade elevada! Obrigado, mercados!) e farta que, sim, chega à mesa de muito mais gente do que no passado, pode ter sido uma das causas de nosso progresso.

Parece que teremos muito o que aprender (e comer…moderadamente) até chegarmos a um nível de compreensão mínimo acerca dos efeitos da ingestão de calorias em nossas vidas. Em verdade, em verdade, eu vos digo: nunca chegaremos a uma compreensão completa (Hayek!) e, portanto, muito mais cuidado e humildade deveriam ter nossos “iluminados” reguladores de agências governamentais: eles mesmos não sabem direito o que fazem (tal como nós). Ora, então porque lhes dar tanto poder para decidir sobre nossa dieta? Podemos votar livremente, mas devemos ser limitados no que desejamos de sobremesa? Não, obrigado.

Corrupção e Julgamento

Na última sexta-feira, em meio a um feriado prolongado, a população tomou conhecimento de um fato inédito: homens próximos a um ex-presidente, ainda ativos no jogo do poder, iriam para a prisão. De maneira surpreendente, os sempre ativos auto-denominados defensores das minorias não celebraram a decisão do juiz – figura polêmica e central no caso – Joaquim Barbosa. Além disso, os – também auto-denominados – “progressistas”, que sempre buscaram se identificar com algum tipo de padrão moralmente superior, calaram-se.

O silêncio, desde a sexta-feira, no país, por parte destes grupos é ensurdecedor.

O fato é surpreendente em si dada a raridade de casos em que corruptos – nas palavras da Lei – são efetivamente punidos. O Brasil que caminhava para um modelo liberal nos anos 90 (uma espécie de social-democracia centro-liberal, se permitem), nos últimos 12 anos, mudou sua direção para o modelo “Nova Classe”, para citar o clássico de Milovan Djilas.

As instituições formais e informais, como sempre centrais em qualquer tentativa de se falar em desenvolvimento econômico, redução de desigualdades, etc, não deixam de se fazer sentir aqui. É difícil dizer em que grau a decisão do STF altera alguma delas. Observamos uma certa acomodação do brasileiro com práticas “rent-seeking”, como dito no texto anterior. A ideologia da vez anestesia a revolta popular contra os abusos do governo e há, mesmo neste episódio, quem tente dizer que a prisão tem conotação política (numa espécie de alucinação criada por se acreditar nas próprias mentiras…).

Do lado das instituições formais, Joaquim Barbosa pode ter feito algo importante mas a pergunta é: o senso de impunidade dos políticos diminuiu com a decisão? A impunidade sobreviverá a Joaquim Barbosa? Vemos demonstrações gritantes de racismo sem o menor protesto das organizações anti-racistas financiados com dinheiro público (embora se digam não-governamentais) e não se observa, ainda, uma mudança de mentalidade do lado Law de Law & Economics quanto à importância de se diminuir a impunidade em prol  de uma sociedade de mercado (é bom lembrar que a revolta contra a impunidade pode ter fundamentos totalitários ou não).

A corrupção foi julgada e condenada pelo sistema legal e parte da sociedade parece acreditar (ou melhor, vende esta idéia, porque acreditar nisto é muita ingenuidade…) que isto tudo não passa de “perseguição política”. O discurso político nunca mudou e nunca mudará. Já a prática política, bem, esta é outra história.

Caso Hayek estivesse vivo e morasse no Brasil, o que ele diria? Difícil dizer. Mas pelos seus escritos, provavelmente apoiaria o juiz Joaquim Barbosa (libertários, por definição, não são racistas e nem apóiam a manutenção de privilégios arbitrários, gerados por decisões políticas), diria que ele está certo e, claro, lamentaria a falta de experimentação de nosso Judiciário.

De qualque forma, esta semana se iniciou menos suja no Brasil. Um pouco de alívio para se respirar não faz mal.

O Desconforto da Pobreza

A pobreza é um desconforto. Quem é pobre, obviamente, sabe disto. Mas a pobreza é um desconforto para políticos também. Ainda bem que assim o seja, pois, caso contrário, perderíamos um incentivo para que os mesmos buscassem minimizar a pobreza afim de ganhar votos.

Entretanto, também é verdade que minimizar a pobreza significa que a mesma deixará de existir em algum momento, obrigando os políticos a inovarem na busca de novos problemas que possam, potencialmente, resolver, afim de ganharem votos. 

Nada disto é novidade ou contra-intuitivo. Qualquer estudante de Escolha Pública já pensou sobre isto por mais de cinco minutos. Mas, o desconforto da pobreza tem uma dimensão adicional quando se pensa no seu impacto no mercado de trabalho. Recentemente, o Brasil passou por um processo de crescimento desigual, no qual os pobres foram favorecidos. 

A classe média brasileira cresceu incluindo os mais pobres – agora um pouco menos pobres – e as consequências disto são várias. Por exemplo, o governo e seus políticos forçaram um aumento das regulações em diversos setores da economia com mais facilidade. Dado que os pobres enfrentam um sério problema de analfabetismo, populistas conseguiram obrigar o setor privado a se tornar mais desleixado com o ensino do português (melhor que uma lei, um sinal claro disto é um ministro dizer, por meio da imprensa, que ortografia é um detalhe “burguês”, quase com estas palavras…).

O setor privado também se curvou, na terra do rent-seeking tropical, e aceitou uma política que nem a ditadura militar nacionalista teve coragem de impor: a bizarra exigência de conteúdo nacional na TV paga e, mais ainda, em horários fixados pelo regulador. É quase como ouvir um político dizer: “se o pobre aprende inglês, vai ter acesso a mais cultura e poderá até emigrar, levando consigo nossos votos….não, precisamos dele em seu curral, para que possa garantir a continuidade de minha dinastia política”. 

Os anos 90 se foram e, com eles, o otimismo do consumidor. Outrora um orgulhoso brasileiro que exigia educação, cortesia e cumprimento de regras por parte dos prestadores de serviços (públicos ou privados), sob a mudança promovida pelos governos de esquerda – notadamente no campo da ética, com a “relativização” da corrupção – hoje o mesmo brasileiro pode ser quase visto como um ser quadrúpede, que ignora a falta de educação do prestador, os maus-tratos que recebe e, como um bom cidadão cubano (ou norte-coreano), acostumou-se com a ineficiência: é capaz de ficar horas na fila de um caixa de supermercado ou de uma repartição pública sem reclamar.

O país mudou. Os burocratas passaram a se achar como os verdadeiros donos da verdade. Sua arrogância média parece ter aumentado nos últimos anos. Falam do poder de mudar o mundo como se vivessem em um outro mundo. Os cidadãos passaram a aceitar a ineficiência como regra. Criam filhos sem educá-los. Não impõem limites – coisa de “neoliberal” ou de “conservadores” – e deixam a educação em último plano. O número de pais reclamando que o menino tem “muita prova para fazer” numa reunião de pais e mestres aumentou. Pais querem filhos que se divertem, mesmo que não saibam a tabuada. 

Estes mesmos pais aplaudem qualquer movimento de jovens (maoístas?) que saem às ruas pedindo por “almoço grátis”. Protestos contra a corrupção? Não, isto não os incomoda. É até perigoso porque, gostoso mesmo, é participar da suruba da corrupção com seu vizinho, seu amigo e com o burocrata cafetão da esquina. O “sexo nos trópicos” ganhou um novo significado: vivemos na orgia constante em que todos são de todos e ninguém é de ninguém. Uma perfeita negação dos princípios básicos de como se pode crescer e distribuir renda de forma eficiente. 

O desconforto da pobreza desaparece para o pobre que, graças ao mercado, pode sair do desconforto material com um emprego um pouco melhor. Ainda bem. Mas se não estudar mais, não conseguirá melhorar mais e apenas terá um alívio no curto prazo. É claro que o ex-pobre percebe isto melhor do que ninguém. Mas ele apenas despertou para o problema insolúvel – no curto prazo – que é o de demandar mais atuação do governo e, ao mesmo tempo, ter que pagar mais impostos. Ainda cheio de doutrinação socialista vinda dos bancos escolares, ele pensa que o governo pode gastar sem arrecadar. Ou pensa que apenas ricos devem pagar impostos. Não pensa com ciência, mas com ideologia. Nada que não possa mudar ao longo do tempo com educação (a verdadeira, não a doutrinação), leituras e, claro, com a própria experiência de vida.

A discussão é difícil e não tenho a solução para este problemas. Mas só há um jeito de começar isto: discutir os problemas institucionais do país. Instituições no sentido de Douglass North. Caso nada dê errado, é o que tentarei fazer por aqui nos próximos posts

Bom final de semana!