O Desconforto da Pobreza

A pobreza é um desconforto. Quem é pobre, obviamente, sabe disto. Mas a pobreza é um desconforto para políticos também. Ainda bem que assim o seja, pois, caso contrário, perderíamos um incentivo para que os mesmos buscassem minimizar a pobreza afim de ganhar votos.

Entretanto, também é verdade que minimizar a pobreza significa que a mesma deixará de existir em algum momento, obrigando os políticos a inovarem na busca de novos problemas que possam, potencialmente, resolver, afim de ganharem votos. 

Nada disto é novidade ou contra-intuitivo. Qualquer estudante de Escolha Pública já pensou sobre isto por mais de cinco minutos. Mas, o desconforto da pobreza tem uma dimensão adicional quando se pensa no seu impacto no mercado de trabalho. Recentemente, o Brasil passou por um processo de crescimento desigual, no qual os pobres foram favorecidos. 

A classe média brasileira cresceu incluindo os mais pobres – agora um pouco menos pobres – e as consequências disto são várias. Por exemplo, o governo e seus políticos forçaram um aumento das regulações em diversos setores da economia com mais facilidade. Dado que os pobres enfrentam um sério problema de analfabetismo, populistas conseguiram obrigar o setor privado a se tornar mais desleixado com o ensino do português (melhor que uma lei, um sinal claro disto é um ministro dizer, por meio da imprensa, que ortografia é um detalhe “burguês”, quase com estas palavras…).

O setor privado também se curvou, na terra do rent-seeking tropical, e aceitou uma política que nem a ditadura militar nacionalista teve coragem de impor: a bizarra exigência de conteúdo nacional na TV paga e, mais ainda, em horários fixados pelo regulador. É quase como ouvir um político dizer: “se o pobre aprende inglês, vai ter acesso a mais cultura e poderá até emigrar, levando consigo nossos votos….não, precisamos dele em seu curral, para que possa garantir a continuidade de minha dinastia política”. 

Os anos 90 se foram e, com eles, o otimismo do consumidor. Outrora um orgulhoso brasileiro que exigia educação, cortesia e cumprimento de regras por parte dos prestadores de serviços (públicos ou privados), sob a mudança promovida pelos governos de esquerda – notadamente no campo da ética, com a “relativização” da corrupção – hoje o mesmo brasileiro pode ser quase visto como um ser quadrúpede, que ignora a falta de educação do prestador, os maus-tratos que recebe e, como um bom cidadão cubano (ou norte-coreano), acostumou-se com a ineficiência: é capaz de ficar horas na fila de um caixa de supermercado ou de uma repartição pública sem reclamar.

O país mudou. Os burocratas passaram a se achar como os verdadeiros donos da verdade. Sua arrogância média parece ter aumentado nos últimos anos. Falam do poder de mudar o mundo como se vivessem em um outro mundo. Os cidadãos passaram a aceitar a ineficiência como regra. Criam filhos sem educá-los. Não impõem limites – coisa de “neoliberal” ou de “conservadores” – e deixam a educação em último plano. O número de pais reclamando que o menino tem “muita prova para fazer” numa reunião de pais e mestres aumentou. Pais querem filhos que se divertem, mesmo que não saibam a tabuada. 

Estes mesmos pais aplaudem qualquer movimento de jovens (maoístas?) que saem às ruas pedindo por “almoço grátis”. Protestos contra a corrupção? Não, isto não os incomoda. É até perigoso porque, gostoso mesmo, é participar da suruba da corrupção com seu vizinho, seu amigo e com o burocrata cafetão da esquina. O “sexo nos trópicos” ganhou um novo significado: vivemos na orgia constante em que todos são de todos e ninguém é de ninguém. Uma perfeita negação dos princípios básicos de como se pode crescer e distribuir renda de forma eficiente. 

O desconforto da pobreza desaparece para o pobre que, graças ao mercado, pode sair do desconforto material com um emprego um pouco melhor. Ainda bem. Mas se não estudar mais, não conseguirá melhorar mais e apenas terá um alívio no curto prazo. É claro que o ex-pobre percebe isto melhor do que ninguém. Mas ele apenas despertou para o problema insolúvel – no curto prazo – que é o de demandar mais atuação do governo e, ao mesmo tempo, ter que pagar mais impostos. Ainda cheio de doutrinação socialista vinda dos bancos escolares, ele pensa que o governo pode gastar sem arrecadar. Ou pensa que apenas ricos devem pagar impostos. Não pensa com ciência, mas com ideologia. Nada que não possa mudar ao longo do tempo com educação (a verdadeira, não a doutrinação), leituras e, claro, com a própria experiência de vida.

A discussão é difícil e não tenho a solução para este problemas. Mas só há um jeito de começar isto: discutir os problemas institucionais do país. Instituições no sentido de Douglass North. Caso nada dê errado, é o que tentarei fazer por aqui nos próximos posts

Bom final de semana!